quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Boi de piranha

Existe uma expressão que talvez muitos desconheçam, que vem do tempo em que a pecuária no Brasil era apenas extensiva. O gado era criado no campo, livre, e era levado pelos peões e seus ajudantes, que iam tangendo as tropas com seus berrantes, muitas vezes atravessando rios caudalosos, alguns cheios de piranhas. Tal expressão é "boi de piranha"
Essas cenas estão incorporadas ao imaginário popular através das músicas sertanejas, das tradicionais-de-raiz às moderninhas-estilo-pop-universitário ou outro nome que o marquetingue fonográfico inventar.
Uma delas, Travessia do Araguaia, explica a exata acepção do termo: um animal mais velho, ou doente, é posto para atravessar um rio cheio de piranhas; enquanto elas devoram o pobre animal, os outros atravessam em segurança. A letra faz uma comparação com o sacrifício de Cristo pela humanidade.
É uma lição pungente. Mas que agora leva uma outra significação, muito mais cruel e menos redentora. Vários partidos políticos, utilizando-se da força da mídia e do marquetingue viral estão usando sub-celebridades, famosos, ex-jogadores de futebol como bois de piranha. Já havia alertado aos problemas do "porque sim" político, mas nem havia me tocado do perigo imenso que isso representa.
Mas os peões de gado partidários logo perceberam: assanhadíssimos se aboletaram na regra da proporcionalidade e do coeficiente que fazem parte do nosso sistema eleitoral.
Ah, o povo não quer mais nos eleger? Rá! Grandes coisas, confabulam. A gente coloca um boi de piranha pra concorrer. Enquanto a imprensa, em todas as suas formas, ataca nosso candidato-boi-de-piranha, faz propaganda pra nós.
Enquanto os intelectuais se debatem como o famoso peixe devorador, aclamando que é um absurdo votar nesses despreparados, analfabetos, desdentados, mendigos, etecétera, enquanto isso vira piada, nosso nome aparece.
E um monte de gente vai querer votar no nosso boi. Sim, ele vai ser devorado. Primeiro, pela imprensa, depois, pelas piadas, depois, pelos intelectuais. E vai ser devorado pela população, que quer votar por protesto, porque não nos aguenta mais.
Nós, os espertos, vamos passar incólumes enquanto oferecemos um triste espetáculo aos que acham que estão protestando, ou votando na base da piada, para dar A NÓS uma lição! É de chorar de rir!!!!!
Mal sabem que, por trás do boi de piranha, estamos nós, a são e salvo, sendo levados pelo sistema eleitoral. Não, eles não queriam votar em nós. Eles queriam até nos dar uma lição, votando em qualquer coisa, menos na gente. E acabam NOS elegendo... hauahuahauhauhauha!
E, jogando com o regulamento debaixo do braço, a gente pode até fingir que perdeu.
Mas o campeonato, esse é e sempre será nosso.


Sim, é assim que os peões pensam. E nós, em geral, caímos direitinho....

3 comentários:

Nanael Soubaim disse...

Então um bando de defensores de direitos humongos sai em defesa do esqueleto, exigindo respeito para o eleito e acaba agraciando também os vampiros que se escondiam à sua sombra. Disse no facebook e repito, o Tiririca não me preocupa, me preocupam os que ele levou consigo, que são potenciais sabotadores da democracia.
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Melancólico.
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O enretenimento revela o eleitor; liguem a tevê, vejam o que faz sucesso e verão o que digo.

Adriane Schroeder disse...

O que mais me dói e ver que uma imensa gama de votos não veio de barracos nem de cortiços, mas de bairros nobres, todos votando em bois de piranha, contrariando o que normalmente a classe média usa como desculpa para a eleição dessa escória, agroa escondida na sombra protetora dos pseuco-famosos e afins.
Não é só o voto do desdentado que elege a rafuagem. Nem é o dinheiro do favelado que sustenta sua campanha.
Lamentável, não?

Nanael Soubaim disse...

Foi-se a época em que idade era sabedoria, em que família era segurança e em que a elite merecia o nome.